Os espíritas de Minas Gerais, notadamente os do Triângulo Mineiro e Região Metropolitana de Belo Horizonte, lembram-se com carinho desse espírita modelar chamado Virgílio Pedro de Almeida ou, simplesmente, “seu Virgílio”, como era mais conhecido.
Ele nasceu no município de Capela, no Estado de Sergipe, em 17 de setembro de 1902. A pequena cidade possuía pouco mais de 10 mil habitantes e abrigava o lar modesto e pobre de seus pais, Cândido Bispo de Almeida e Maria Senhorinha Almeida, e de suas irmãs, Olindina e Enedina.
Ainda muito jovem, Virgílio começou a trabalhar na cidade de Japaratuba/SE, na farmácia de seu padrinho Sr. Helvécio Campos, de quem recebeu incentivo e apoio para estudar na Capital do Estado e formar-se em Contabilidade. Durante o curso, teve despertado o espírito de liderança, fundando e presidindo o Grêmio Estudantil da Academia de Comércio, com o apoio dos colegas e professores. Amante do esporte, afeiçoou-se ao remo, modalidade em que, durante uma década, competiu como atleta em memoráveis regatas, em Aracaju e outras cidades, conquistando, no “oito com patrão” sob seu comando, campeonatos e medalhas.
Em 5 de junho de 1922, ainda estudante, ingressou no Banco do Brasil em Aracaju, como contínuo, sendo posteriormente promovido a escriturário em virtude de aprovação em concurso interno.
Em 19 de janeiro de 1930, casou-se com a jovem Maria Zulnária Carvalho, de cuja união nasceram os filhos Zica, Gilca, Isis e Gil. Estando sua esposa grávida do último filho, Virgílio descobre estar com tuberculose pulmonar, sendo mandado a Belo Horizonte, para tratamento no Sanatório Hugo Werneck. Ali recebe a notícia do nascimento do filho caçula, cujo nome fez questão de escolher. Nessa ocasião, já se tornara espírita, após ter conhecido uma das maiores figuras do Espiritismo sergipano, Basílio Peralva, pai do conhecido expositor, escritor e jornalista José Martins Peralva, autor de consagrados livros editados pela FEB e, durante muitos anos, Secretário da União Espírita Mineira e editor de O Espírita Mineiro.
Curado da insidiosa enfermidade, Virgílio é designado para servir na cidade de Três Corações, para onde se transferiu com a família. Inteligente, arguto, raciocínio ágil e íntegro, exerceu no Banco do Brasil importantes cargos de confiança nas cidades de Curvelo, Carangola, Carlos Chagas e Formiga. O coroamento de sua carreira bancária deu-se na função de inspetor de agências, em que se aposentou em 1955 e em cujo exercício fiscalizou as filiais de Belo Horizonte, Uberaba, Uberlândia, Araguari, Ituiutaba e de outras cidades menores. Em cada uma dessas cidades, agia como verdadeiro semeador da verdade espírita, fundando centros para o estudo da Doutrina onde não os havia ou estimulando as atividades de estudo doutrinário naqueles já em funcionamento.
Em Belo Horizonte, onde teve destacada atuação no Movimento Espírita, foi um dos primeiros presidentes da Aliança Municipal Espírita. Em sua gestão, marcada pelo dinamismo, nasceu o embrião da Feira do Livro Espírita - a Exposição do Livro Espírita, inaugurada solenemente em 22 de setembro de 1973, no Terminal Rodoviário da Capital Mineira, com a presença de Noraldino de Mello Castro, Neném Alluotto e outros dirigentes da União Espírita Mineira, além de representantes de várias instituições espíritas locais, entre os quais Salvador Schembri. O interesse do público pelo Espiritismo superou as melhores expectativas, pois numa semana venderam-se centenas de exemplares das obras de Allan Kardec, André Luiz, Emmanuel e Humberto de Campos.
Virgílio resolve, então, apoiar o plano do jovem médium João Nunes Maia, que lançara com sucesso, em 1958, a Campanha do Livro Espírita Gratuito. Consistia o novo plano em transportar livros espíritas numa ‘Kombi’ - convertida em banca de livros itinerante -, expô-los em praça pública ou locais adequados e oferecê-los a quem os quisesse adquirir, em roteiro que abrangia bairros de Belo Horizonte e cidades vizinhas.
Há um fato ocorrido com Virgílio na livraria da União Espírita Mineira, onde trabalhava João Nunes Maia, e que bem reflete a sua sensibilidade e amor à causa do livro espírita. Percebendo o semblante angustiado do médium, procurou descobrir a razão do visível abatimento. Ficou sabendo que seu primeiro livro mediúnico, Alguns Ângulos dos Ensinos do Mestre, ditado três anos antes pelo espírito Miramez e cuja impressão fora autorizada por um amigo, estava retido na gráfica, por falta de pagamento, há muitas semanas. Virgílio, que já sabia do fato por intuição, sorriu e perguntou a quanto montava a dívida. Informado do valor, preencheu um cheque, assinou-o e entregou-o a João Nunes Maia que, vibrando de intensa alegria, agradeceu comovido o gesto inesperado do grande amigo e benfeitor.
O inexcedível espírito de liderança e a excepcional capacidade de trabalho - características marcantes de sua inconfundível personalidade - levaram Virgílio a criar e fortalecer inúmeras obras espíritas na Capital Mineira. Assim é que seu nome está ligado à fundação do Hospital Espírita André Luiz, do qual foi Diretor-Administrativo, ao Ancianato Paulo de Tarso e Ginásio Comercial Caminho Profissional, nos quais atuou como Diretor, e ao Centro Espírita Divino Amigo, de que foi o primeiro Presidente.
Episódio inusitado, evidenciador do respeito que seu nome infundia, ocorreu durante a construção da sede do “Divino Amigo”, situada em região periférica da cidade. Ao saírem, altas horas da noite, da obra em que haviam trabalhado como “pedreiros voluntários\”, os confrades Acyr Miranda e Arnon Lopes Moreno, roupas marcadas de cimento e tinta, sem portar nenhum documento de identidade, foram confundidos com marginais, detidos e conduzidos em viatura policial à Delegacia mais próxima. Ao saber da notícia, Virgílio entrou imediatamente em contato telefônico com a confreira Rosalina Dutra Agrícola, irmã do Diretor da Penitenciária Agrícola de Neves, através de quem conseguiu liberar os dois amigos do incômodo ‘xadrez’ onde se encontravam recolhidos.
Além das entidades citadas, Virgílio figurou como Presidente da Associação Espírita Célia Xavier, do Grupo Espírita Obreiros Mediúnicos, do Grupo Espírita Ergue-te e Caminha e do CRE da Zona Metalúrgica. Foi também Diretor do Abrigo Jesus, da Fundação Espírita Nosso Lar, do Recanto da Saudade, do Clube Esperanto, da Pupileira Eunice Weaver e do Colégio “O Precursor”, fundado pela União Espírita Mineira. Figura de vanguarda nos esforços unificacionistas, preocupava-se com as casas adesas que não participavam ativamente das reuniões ou iniciativas da AME ou do CRE.
Para os que se opunham ao movimento unificador, adotava a postura de evitar conflitos e polêmicas, mantendo atitude de respeito a todos, deixando evidente que não se pode violentar nenhuma consciência. Buscava, no entanto, em todas as oportunidades, esclarecer o verdadeiro sentido da unificação do movimento espírita, num trabalho perseverante e fraterno, cujos frutos foram as inúmeras adesões conseguidas. Afirmava que um dos mais sérios problemas do movimento espírita era o da centralização das atividades doutrinárias pelo dirigente da Casa Espírita, o que estimulava o personalismo monopolizador.
Outro problema identificado por ele como inibidor do progresso, era a falta de especialização de tarefas dos trabalhadores da casa espírita. Propunha, diante disso, que se buscasse “a descentralização das atividades na casa espírita, visando a democratizá-la e fortalecê-la”, e também o trabalho de equipe, no qual “cada um desempenhará a tarefa que tenha mais possibilidade de desenvolver para o melhor benefício coletivo.”
DESENCARNE
Virgílio Pedro de Almeida desencarnou vitimado por câncer no pâncreas, na tarde de 8 de janeiro de 1974, em sua residência, em Belo Horizonte. Homem humilde, cordato, sério e de sólida formação moral, foi trabalhador infatigável da causa do amor ao próximo, cuja existência terrena soube dignificar com exemplos de autêntico cristão.
O sepultamento do seu corpo ocorreu no Cemitério Parque da Colina, na capital mineira, e contou com a presença dos inúmeros amigos e de caravanas de espíritas de diversas cidades, entre as quais: Boa Esperança, Formiga, Rio de Janeiro e São Paulo.
Do Mundo Espiritual onde se encontra, Virgílio continua atuante, ditando mensagens de orientação, estímulo e consolo através de vários médiuns, entre eles, Célia Lucchesi de Carvalho, Wanderley Soares e Wagner Gomes da Paixão.
Fonte: Jornal “O Espírita Mineiro”, nº.280 (julho/agosto – 2004).